quinta-feira, 23 de junho de 2022

REMADA DE INVERNO 2022 - Relato de remador: Pedro Piqueres

Tomar decisões não é um ato simples. Ultimamente tenho tentado praticar, sob a premissa: o que eu faria numa situação destas? A Remada de Inverno, que foi adiada por dois anos em função da Pandemia, finalmente chegou. Desta vez o planejamento foi previsto para 4 dias, um trecho maior, partindo de Torres/RS, até o Recanto do Leonardo e Tiane, passando por lagoas, rios e canais, tudo em comemoração ao décimo aniversário. A Lagoa Itapeva, que eu admirava quando passava pela BR 101, era a última que me faltava remar, no trecho Torres a Imbé. Eram muitas as adesões, mas infelizmente não se confirmaram, por diversos problemas que acontecem. Velhos amigos não viriam, outros novos se apresentaram. Uma remada destas, não começa no primeiro giro do remo. São dias de preparação, revisão de equipamento, ainda mais depois de tanto tempo sem atividades mais longas, combinações, momentos impagáveis que fazem parte do jogo. No dia anterior parti em direção à Torres com a foto costumeira em frente ao simpático Rio Cai, que tenho orgulho de apresentar aos meus amigos. Viagem tranquila cheguei ao sítio Reino Encantado, de propriedade da Dona Teresinha, junto ao local de partida, onde aos poucos parte do pessoal se acomodava. Depois veio o chimarrão, seguido de uma massa com linguiça, regada a vinho tinto seco, recheada com histórias de quem não se via há dois anos. O despertar sempre é cedo, muito cedo. Com alguma dificuldade, na parte mais norte da Lagoa Itapeva, num local estreito, após acomodar todos caiaques carregados com as tralhas, tivemos o briefing do Leonardo, e era hora de partir. Foi lá num bate papo com o proprietário das terras, e rápida pesquisa posterior, que descobri que ali, no passado aquaterrisavam 2 hidroaviões da saudosa Varig, o “Atlântico” e o “Gaúcho”, com tripulação e 6 passageiros, no então conhecido Porto dos Cunhas. Sempre que posso, tento fazer associações geográficas e históricas pelos locais que passo. A beleza da lagoa aos poucos se apresentava, num belo dia de sol e brisa de popa. Seguimos pela margem Oeste, até uma prainha de areia, onde tomamos café e logo seguimos para uma praia de seixos, cidade de Três Cachoeiras. Dois belos lugares que não se tem noção passando rápido pela rodovia. Quem dirige, normalmente quer chegar rápido, quem rema tem mais tempo para apreciar as paisagens. Seguimos em direção ao Rio Três Forquilhas, somente depois de achar o caminho escondido entre os juncos, onde pegaríamos rumo até o Sítio Lima e Silva, para o primeiro acampamento. Junco numa lagoa é como pimenta na comida, quando tem demais a coisa complica. Após passarmos sob a famosa ponte em curva, o rio estreita bastante, alterando em muito a paisagem entre frondosas figueiras. Foram aproximadamente 35 km percorridos. Montei o acampamento mais próximo do galpão, pois era esperada chuva para a noite. Depois observei que o pessoal ficou mais próximo a água.
Todos bem e reunidos, era hora do famoso Sopão do Lacerda, e seus causos do “Nego Osvaldo”. Noite divertida, mas curta. Como todos vieram de viagem, alguns de longas distâncias para ali estar, o pessoal se recolheu cedo, ficando eu solito a apreciar a luz da lua, sob os olhares do gato da casa. A chuva prevista para sexta-feira, veio aos poucos, a partir da 5 da manhã. Entre guardar tudo molhado, resolvi por recolher tudo no galpão, e de café já passado, guardar as coisas no caiaque, ao som dos roncos dos “bugios” (hahaha). Antes da partida, resolvemos por abortar uma portagem no trajeto do dia (passagem de um braço do rio para outro, por terra), pois sob chuva havia risco de alguma queda. Perdemos em paisagem, mas foi uma boa decisão, ainda mais para quem já rompeu um tendão do tornozelo num tombo de margem e teve que remar mais dois dias sem atendimento. Nosso objetivo então era chegar ao lado Sul da Lagoa Itapeva, voltando pelo Rio Três Forquilhas. O percurso foi curto, aproximadamente 15 km, mas foi sob chuva, o tempo inteiro. Com a chegada da neblina, onde sequer se enxergava a margem, se formaram ao natural 2 grupos de remadores, pois não era recomendável manter afastamentos naturais. Com a presença de pequenas ondulações, todo mundo de leme ou skeg baixado, até eu, que não costumo usar, dadas as condições mais tranquilas de onde remo, onde basta adernar para corrigir o rumo. Entre algumas paradas, que o Alex usava para revisar o GPS e achar o local do acampamento (a neblina fechou de vez), eu conversava com o Marcio sob o que fazer naquelas condições remando sozinho? Penso que aprendemos ou pelo menos deveríamos, com as diversas situações que se apresentam. Sempre temos a oportunidade de praticar. Vimos ao longe luzes de farol de automóvel. Deveria ser lá. O pessoal é esperto, ligaram pro Super André, que colocou o carro na beira da lagoa fazendo a sinalização. Penso que todos chegaram bem, a exceção de mim, que sofri com formigamento e dor no ciático da perna direita, a ponto de não conseguir comandar o leme, além de sintomas de “ter pego frio além da conta”. Creio que a causa tenha sido não ter usado a almofada de ajuste que tenho, alterando a postura e ergonomia na remada. Somado ao fato de um desconforto lombar que me acompanha a um certo tempo, e deu as caras no dia anterior, tinha de tomar uma decisão: prosseguir ou não? A decisão foi tomada quando ainda remava, em chegando bem, o objetivo primeiro estava cumprido: ter participado da RI, e em segundo: ter conquistado a Lagoa Itapeva. Tenho pavor de dar trabalho ou atrapalhar os outros. Se estivesse sozinho a decisão seria certa por parar, e não é por estar acompanhado que teria o direito de continuar. Afinal havia mais 2 dias pela frente. E ali era o local mais oportuno e fácil de parada. É de batalhas que se vive a vida, e a minha estava terminada.
Tudo arrumado, deu até pra fazer um tardio almoço, aliás remada em que melhor me alimentei até hoje. A noite tivemos o entrevero do Chef Lacerda, e muita diversão, com as histórias e piadas da noite, desta vez muito boa, onde até fogueira de churrasqueira teve. Foi lá que descobrimos quem afinal toma o tal “vinho doce”. É duro no outro dia ver os amigos partindo e ficar em terra, mas era necessário e estava feliz e satisfeito. O dia amanheceu lindo, onde fiquei apreciando o nascer do sol junto com a minha térmica vermelha e inseparável café. As 7 horas em ponto, o Davi, um Catarina prá lá de simpático, fez como de costume a alvorada ao som do seu trompete. Ahh, ganhei uma camiseta do Oceânicos Floripa (tá lá no face e instagram, grupo nota 10 – vale a pena conferir), a qual guardarei como troféu. Aproveitei para ajudar o pessoal do apoio na limpeza, e era hora de voltar. Creio que o pessoal não ficará brabo em eu compartilhar algumas fotos deles aqui. Como são muitas, tenho que escolher sem um critério muito técnico, mas cronológico, de modo que não sei a autoria para dar os créditos, apenas as aéreas são do “tuiuiú do Léo”, e as de captação da luz de forma incomparável, do Xirú. Peço desculpas em especial ao Daniel Mulita, por não ter conduzido a bandeira do Uruguai, até o final da remada. A remada finalizou com sucesso, onde até ligação de vídeo recebi dos amigos, direto do local de acampamento. Agora é recuperação e bola pra frente, pois já vieram novos projetos.

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